Vigostki atribui à escola e à educação uma importância fundamental no desenvolvimento das funções cerebrais superiores. Sendo a interacção humana e sócio-cultural um factor essencial para o desabrochar do intelecto dos jovens em formação, a escola não poderia deixar de ter uma palavra decisiva nesse processo. Na esteira de Piaget, Vigostki traça a distinção entre os conceitos espontâneos e os conceitos científicos – os primeiros derivam da experiência diária do quotidiano, serão portanto formados a partir de uma acção prática activa e liberal - não-dirigida; os segundos serão induzidos, daí baseados num papel mais passivo no processo de aprendizagem. Mas não se entenda esta passividade como um factor negativo, já que o que os alunos aprendem na escola não poderiam aprender por si próprios. É precisamente esta função de superação que transforma o conceito científico num elemento precioso em todo o processo do desenvolvimento. A escola leva à problematização de questões que de outro modo ficariam latentes e adormecidas, por exercitar, arredadas das operações intelectuais das crianças. A escola acelera e optimiza o desenvolvimento intelectual dos jovens por via da indução dos conceitos científicos.
(...) O desenvolvimento da capacidade de abstracção ... (continuação)
B. Estágio dos Conceitos Potenciais – Esta fase caracteriza-se pelo critério da unicidade. Enquanto que no estágio anterior o critério de agrupamento se pautava por uma generalidade de atributos preferenciais que tornavam os objectos semelhantes, agora o critério é substituído pelo agrupamento com base num único atributo. Vigostki sugere que este traço característico dos conceitos potenciais (a tendência para a analogia com base em critérios de selecção unitários e singularizados), manifesta-se também nos animais. Este facto poderá ser constatado, por exemplo, nas experiências de Koehler, já que os chimpanzés tendiam a utilizar outros objectos compridos de modo a tentar alcançar as bananas inacessíveis. Esta evidência, denota portanto, uma tendência para a abstracção, já que instintivamente, as operações psíquicas tendem a isolar determinados princípios que não estão ligados a um único objecto – no estádio pré-verbal mais precoce, as crianças esperam nitidamente que situações semelhantes levem a resultados idênticos. Poderíamos ser levados a colocar a seguinte questão – Mas o complexo associativo também não isola os elementos segundo características singulares e tendencialmente abstractas? Vigostski Responde – a diferença reside no facto de nos conceitos potenciais, o critério tender para a solidez, ao contrário do complexo associativo, que como vimos, era volúvel e tendia a alterar-se constantemente – no pensamento por complexos, o traço abstraído é instável, não ocupa uma posição privilegiada e facilmente cede o seu domínio temporário a outros traços. Nos conceitos potenciais surge a tendência para a perenidade e para a solidez, características que visam estabelecer critérios de relação revestidos pela universalidade, indefectíveis.
Segundo Vigostki, as suas investigações têm o condão de provar que a teoria tradicional de desenvolvimento dos conceitos tem lacunas e erros. A formação de conceitos não se baseia na simples interacção das associações, mas mediante uma operação intelectual em que todas as funções mentais elementares participam de uma combinação específica. Essa operação é dirigida pelo uso das palavras para centrar activamente a atenção, abstrair determinados traços, sintetizá-los e simbolizá-los por meio de um signo. Estas operações mentais são primeiramente organizadas através da formação de complexos, aproximando-se posteriormente da abstracção pura por via dos conceitos potenciais. Neste percurso de desenvolvimento, o uso da palavra é fundamental, tal como a interacção com interlocutores que servem de modelo e de núcleo orientador para o sentido e significação, que de outro modo se dispersaria por vias não coincidentes – a palavra conserva a sua função directiva na formação dos conceitos verdadeiros, aos quais esses processos conduzem – não se entenda contudo que a função mediadora da palavra e as relações interpessoais entre interlocutores seja sempre vantajosa para uma criança
3ª Fase - Desenvolvimento da Capacidade de Abstracção – É uma segunda raiz matricial do pensamento conceptual. O pensamento por complexos estabelece elos e relações, dá início à unificação das impressões desordenadas. Mas o conceito requer algo mais do que a união e o estabelecimento de laços relacionais entre elementos – requer acima de tudo abstracção, ou seja, a capacidade de poder invocar elementos para lá dos seus elos associativos factuais. Lembremos as experiências de Koehler - o conceito requer a capacidade para isolar as ideias segundo meios puramente intelectuais, ou seja, independentemente da imagem factual que caracteriza a organização por complexos. É precisamente esta capacidade que a terceira fase do desenvolvimento mental infantil pretende investigar – os primeiros passos em direcção à abstracção.
A. Agrupamentos Com o Máximo de Semelhança – De acordo com as observações de Vigostski, o primeiro passo em direcção à abstracção deu-se quando a criança agrupou objectos com um grau máximo de semelhança. Nesta fase, a criança centra a sua atenção em determinados atributos de sua preferência, e tende a isolar todos os objectos que obedeçam a esse critério, embora frequentemente a abstracção de um tal grupo de atributos se baseie apenas numa impressão vaga e geral da semelhança entre os objectos. O princípio de exclusão que leva a cindir o critério de escolha tende para a predominância dos atributos em detrimento das características gerais do objecto – este é um passo decisivo para a ideação, ou seja, para a tomada de consciência da distinção entre o símbolo e o signo, entre a designação do objecto e o objecto propriamente dito, e acima de tudo, para a diferenciação entre o conceito generalizador e o elemento particular que lhe subjaz – entre género e espécie, de acordo com a árvore de Porfírio (a diferença entre animal e gato, geral e particular).